A divulgação da deflação de 0,02% no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) de agosto trouxe novas reflexões sobre a possível alta da taxa Selic na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), programada para a semana que vem. Com os números mais favoráveis da inflação, cresce a possibilidade de o Banco Central (BC) manter a taxa nos atuais 10,50% ao ano, ainda que algumas pressões inflacionárias persistam.
IPCA positivo, mas pressões ainda presentes
Os dados do IPCA de agosto, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram amplamente vistos como positivos. Economistas avaliam que a deflação pode ser um fator que desestimule a alta de juros pelo BC, uma vez que o indicador de inflação, considerado um dos principais termômetros da economia, desacelerou.
André Valério, economista sênior do Inter, destacou que o IPCA de agosto foi positivo tanto qualitativa quanto quantitativamente. “Observou-se um recuo de pressões observadas em julho, especialmente no núcleo da inflação e nos serviços, o que diminui o receio de uma retomada inflacionária”, afirmou. Valério ainda menciona que a difusão das altas se manteve abaixo dos 60%, um dado que fortalece a tese de uma inflação controlada.
No entanto, Valério também ressalta que a desancoragem das expectativas inflacionárias nos últimos meses pode pesar na decisão do Copom. “Ainda que o cenário atual não indique uma necessidade urgente de aumento de juros, a incerteza sobre as expectativas para os próximos meses pode manter o BC em estado de alerta”, disse.
Impactos da bandeira tarifária e clima no cenário futuro
Enquanto o IPCA de agosto trouxe alívio, alguns economistas, como Claudia Moreno, do C6 Bank, alertam para o possível aumento da inflação em setembro. Isso se deve, em parte, à mudança da bandeira tarifária para vermelha 1 que adicionará 0,27 ponto percentual à conta de luz, pressionando o IPCA no mês seguinte. Além disso, as atuais condições climáticas, como a seca em algumas regiões, podem afetar negativamente os preços de alimentos e outros insumos.
Moreno projeta que, apesar da deflação de agosto, a inflação deve retornar a partir de setembro. “Se em agosto a deflação da energia elétrica contribuiu para a queda do IPCA, em setembro esse mesmo componente vai pressionar o índice, devido ao aumento da tarifa de energia”, explicou. O C6 Bank prevê que o IPCA encerre o ano em 4,7%, acima da meta do BC, o que manteria o debate sobre a necessidade de ajustes na taxa Selic.
Com a deflação, a expectativas da Selic aumenta
Com a deflação de agosto, a expectativa de manutenção da Selic ganhou força, mas ainda há divergências entre especialistas. Luis Otávio Leal, economista-chefe da G5 Partners, argumenta que o resultado do IPCA não elimina a possibilidade de uma alta dos juros, embora a pressão para uma elevação de 0,50 ponto percentual tenha diminuído. Leal aponta que o Copom pode optar por um aumento menor, de 0,25 ponto percentual, caso decida intervir para conter possíveis pressões inflacionárias futuras.
Outros economistas, como Gustavo Cruz, da RB Investimentos, acreditam que o BC poderia manter a taxa de juros no patamar atual de 10,50% ao ano, sem necessidade de novas elevações. Segundo Cruz, os dados de inflação não justificam uma ação imediata. “O cenário externo está se tornando cada vez mais favorável, com os principais bancos centrais do mundo cortando juros e o preço do petróleo em queda, o que alivia os custos da cadeia produtiva”, comentou.
Por outro lado, Gustavo Sung, economista-chefe da Suno Research, lista fatores que podem influenciar uma decisão de alta dos juros: a pressão sobre os bens industriais e o aumento dos preços de energia. Ambos são afetados pela recente desvalorização cambial e pelas condições hidrológicas desfavoráveis. Além disso, Sung observa que o crescimento robusto da economia pode gerar pressões inflacionárias ou retardar o ritmo de desaceleração da inflação.
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Debate sobre o cenário internacional e impacto na decisão do BC
O cenário internacional também exerce influência sobre a decisão do Banco Central. Com os principais bancos centrais, como o Federal Reserve (Fed) dos EUA, cortando juros, o Brasil pode se beneficiar de um alívio externo. A valorização do real frente ao dólar e a queda nos preços do petróleo são fatores que podem compensar as pressões inflacionárias internas.
André Fernandes, da A7 Capital, argumenta que o mercado deve seguir pressionando o Copom por um aumento de juros. Porém, também há um entendimento de que manter a Selic será a decisão mais acertada. “Com a deflação do IPCA e a tendência de corte de juros no exterior, o BC pode ponderar bem antes de decidir por uma elevação”, disse.
Já Étore Sanchez, da Ativa Investimentos, considera que a divulgação do IPCA de agosto e o cenário internacional tornam viável a manutenção da Selic. “O Banco Central tem reiterado sua dependência dos dados, e a surpresa positiva do IPCA de agosto pode deixar a opção de manutenção da taxa mais viva”, afirmou.
A decisão do Copom na próxima semana será marcada por um cenário desafiador, com a deflação de agosto adicionando um novo componente à equação. Apesar da melhora nos números da inflação, as pressões externas e internas, como a seca, a bandeira tarifária e a expectativa de inflação acima da meta, manterão o Banco Central em cautela. A decisão entre manter a Selic em 10,50% ou iniciar um ciclo de alta será tomada com base em um balanço delicado entre os dados econômicos e as expectativas de mercado.