A presença de mulheres nos cursos de ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) no Brasil tem crescido ao longo da última década. No entanto, a taxa de conclusão dessas graduações caiu significativamente desde a pandemia de covid-19.
De acordo com um levantamento da Nexus – Pesquisa e Inteligência de Dados, baseado em dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), apenas 27% das mulheres que ingressaram nesses cursos em 2023 concluíram a formação. Em comparação, 23% dos homens conseguiram finalizar os estudos.
O declínio na taxa de conclusão foi mais acentuado entre as mulheres, representando uma redução de 48% em relação a 2019, quando 53% delas concluíram a graduação. Para os homens, a queda foi de 36%. O levantamento foi divulgado no Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, celebrado em 11 de fevereiro.
Impactos da pandemia e desigualdade de gênero
O CEO da Nexus, Marcelo Tokarski, explica em entrevista para a Agência Brasil que a pandemia impactou a conclusão dos cursos para ambos os gêneros, mas as mulheres foram mais afetadas. Entre os principais motivos estão os desafios econômicos, como o desemprego e a queda na renda familiar, além do aumento da carga de trabalho doméstico e do cuidado com familiares.
A vice-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Francilene Garcia, também em entrevista para a Agência Brasil reforça essa análise. Segundo ela, em períodos de crise sanitária e econômica, as mulheres são mais exigidas socialmente para cuidar de seus lares e familiares, o que compromete sua permanência na universidade.
“É natural que a gente entenda que há uma pressão maior da sociedade sobre as mulheres em períodos de crises sanitárias como essa que a gente viveu. As mulheres acabam sendo demandadas a assumir ou ocupar espaços junto ao seu núcleo familiar, o que muito provavelmente as colocou em situações desfavoráveis para continuar a formação”, afirma Garcia.
Mais mulheres ingressam em STEM, mas ainda enfrentam barreiras
Embora a taxa de conclusão tenha caído, o número de mulheres ingressando em cursos de STEM tem aumentado. Em 2023, 26% dos novos alunos nesses cursos eram mulheres, um crescimento de 29% em relação a 2013. No entanto, o aumento no número de ingressantes homens foi o dobro, alcançando 56% no mesmo período.
A desigualdade no número de formandos mostra que, mesmo interessadas, as mulheres enfrentam mais barreiras para concluir seus estudos. Tokarski destaca que, tradicionalmente, as mulheres apresentam uma taxa de conclusão superior à dos homens. O fato de essa taxa ter despencado indica que políticas públicas são necessárias para garantir que mais alunas cheguem ao diploma.
Principais cursos escolhidos por mulheres
As mulheres que ingressaram nos cursos de STEM em 2023 se dividiram majoritariamente em três áreas:
- Engenharias: 48% das calouras;
- Computação e tecnologias da informação e comunicação (TIC): 43%;
- Ciências naturais, matemática e estatística: 9%.
O estudo aponta uma tendência de queda no interesse feminino pelas engenharias, com uma redução de 21% na procura entre 2013 e 2023. Por outro lado, os cursos ligados à computação cresceram 368% no mesmo período, demonstrando uma mudança de perfil no interesse das mulheres dentro das ciências exatas.
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A importância da diversidade na ciência
A presença de mulheres na ciência não é apenas uma questão de equidade, mas também de qualidade da produção científica. Garcia ressalta que uma ciência mais diversa e plural traz melhores resultados para a sociedade.
“A ciência vai ser tão mais impactante para a vida humana na Terra quanto mais plural e diversa ela for. A gente precisa ter homens e mulheres capazes de estudar e conhecer os fenômenos que a gente vive hoje, os problemas globais, as questões locais, com a presença equilibrada”, destaca a especialista.
Para reverter a queda na conclusão dos cursos, especialistas sugerem políticas afirmativas, como bolsas de estudos específicas para mulheres, editais voltados para pesquisadoras e suporte financeiro e social para garantir que mais alunas consigam concluir sua formação. A retomada dessas iniciativas pode ser crucial para equilibrar a presença feminina no setor e garantir que mais mulheres tenham oportunidades de se destacar na ciência.