A deflação, fenômeno econômico caracterizado pela queda generalizada dos preços, voltou a ser pauta no Brasil. Em agosto de 2024, o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) registrou uma retração de 0,02%, a 17ª deflação desde o início do Plano Real, em 1994.
Para um país que enfrentou uma longa batalha contra a hiperinflação, pensar na queda dos preços pode gerar confusão. Afinal, a deflação é boa ou ruim para a economia?
O que é a deflação?
De maneira simples, a deflação ocorre quando há uma queda contínua e generalizada dos preços de bens e serviços em um determinado período. Esse processo é o oposto da inflação, que se caracteriza pelo aumento dos preços. Enquanto a inflação é conhecida por corroer o poder de compra dos consumidores, a deflação, à primeira vista, pode parecer vantajosa, pois significa preços mais baixos para os consumidores. No entanto, o impacto desse fenômeno vai muito além das aparências.
A deflação está geralmente associada a uma diminuição da demanda que pode ser causada por dois fatores principais: um aumento da oferta, com os produtos disponíveis em excesso no mercado, ou uma retração dos consumidores, ao preferir poupar em vez de gastar. No contexto brasileiro de agosto de 2024, a queda foi impulsionada por fatores pontuais, como a redução de 2,77% nos preços da energia elétrica residencial, devido à volta da bandeira tarifária verde, e a diminuição dos preços de alimentos e bebidas, o que influenciou a categoria de Habitação, com uma queda de 0,51%.
Leia também: Deflação de agosto em 0,02% aumenta incertezas sobre alta de juros pelo BC
Apesar desse cenário positivo momentâneo, a situação pode se reverter rapidamente. Para setembro, a bandeira tarifária vermelha de patamar 1 será acionada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), o que significa que os preços de energia devem voltar a subir, pressionando novamente o IPCA.
Deflação: sinais de alerta para a economia
Se por um lado a deflação traz alívio no curto prazo ao reduzir os gastos dos consumidores, por outro uma deflação persistente pode ser prejudicial à economia. A redução contínua de preços pode sinalizar uma desaceleração da atividade econômica. Quando a demanda por produtos cai, as empresas têm dificuldade em manter seus níveis de produção, o que gera capacidade ociosa. Em resposta, os empresários podem postergar investimentos, como a abertura de novas fábricas ou a expansão de linhas de produção.
Esse ciclo negativo pode levar a um aumento do desemprego, uma vez que, sem a necessidade de expandir ou manter a produção, as empresas começam a demitir funcionários. Além disso, o governo pode ser forçado a intervir, aumentando seus gastos para estimular a economia, o que pode elevar o endividamento público.
A deflação também afeta diretamente o setor produtivo. Quando as empresas percebem que os preços estão caindo, a expectativa de retorno sobre seus investimentos diminui. Isso gera um efeito cascata que afeta desde pequenos empreendedores até grandes indústrias, que passam a evitar novos investimentos por medo de uma queda contínua na demanda. O resultado pode ser uma economia estagnada, com menos empregos e menos renda circulando.
O histórico da deflação no Brasil
Embora a deflação não seja comum no Brasil, o país já registrou 17 episódios desde o início do Plano Real, em 1994. A lista de meses com deflação inclui:
- Agosto/1997: -0,02%
- Julho/1998: -0,12%
- Agosto/1998: -0,51%
- Setembro/1998: -0,22%
- Novembro/1998: -0,12%
- Junho/2003: -0,15%
- Junho/2005: -0,02%
- Junho/2006: -0,21%
- Junho/2017: -0,23%
- Agosto/2018: -0,09%
- Novembro/2018: -0,21%
- Setembro/2019: -0,04%
- Abril/2020: -0,31%
- Maio/2020: -0,38%
- Julho/2022: -0,68%
- Junho/2023: -0,08%
- Agosto/2024: -0,02%
Esse histórico mostra que a deflação no Brasil ocorre em momentos específicos, normalmente associados a fatores sazonais, como a queda nos preços da energia elétrica ou de alimentos. No entanto, mesmo que esses episódios sejam esporádicos, eles sempre trazem à tona discussões sobre o impacto desse fenômeno na economia.
O que esperar para o futuro?
A deflação de agosto de 2024 é um exemplo claro de como fatores externos e temporários podem impactar os índices de preços no Brasil. No entanto, especialistas alertam que o cenário pode mudar rapidamente. A previsão de aumento nos preços de energia em setembro, por causa da ativação da bandeira vermelha, deve pressionar o IPCA para cima novamente.
Além disso, outros fatores econômicos, como as condições climáticas que afetam a produção de alimentos, também devem influenciar a inflação nos próximos meses. O aumento do desemprego, a retração dos investimentos e a falta de estímulo ao consumo são riscos a serem considerados, especialmente se houver uma desaceleração mais ampla na economia global.
Em um cenário de deflação persistente, o governo pode precisar intervir para estimular a demanda, por meio de investimentos em infraestrutura, redução de impostos ou até mesmo pacotes de estímulo. No entanto, essas medidas têm um custo elevado que pode resultar em um aumento do déficit público e maior endividamento do Estado.
A deflação, apesar de trazer benefícios imediatos para os consumidores, como a queda nos preços, pode ser um sinal de problemas econômicos mais amplos. No Brasil, o episódio de agosto de 2024 acende o alerta para os riscos de uma possível desaceleração da economia. Isso pode afetar tanto o setor produtivo quanto o mercado de trabalho. O desafio é encontrar o equilíbrio entre preços controlados, uma economia saudável e capaz de gerar emprego e renda para a população.