Formalizar um relacionamento traz muitas dúvidas e uma das mais comuns diz respeito à distinção entre união estável e namoro qualificado. Embora ambos os modelos representem uma formalização do vínculo afetivo, existem diferenças legais importantes que impactam os direitos e deveres patrimoniais e sucessórios do casal.
Entender essas distinções pode evitar problemas futuros e garantir que o relacionamento seja reconhecido segundo a realidade do casal.
A união estável é uma modalidade reconhecida pela lei brasileira como similar ao casamento civil, mas sem a necessidade de uma cerimônia formal. Já o namoro qualificado é um tipo de relacionamento que, apesar de envolver comprometimento e estabilidade, não gera os mesmos direitos patrimoniais.
O que caracteriza uma união estável?
Para ser considerada uma união estável, uma relação precisa ter algumas características específicas, como explica a advogada especializada em direito de família Marina Dinamarco. Os quatro atributos necessários são: publicidade, durabilidade, continuidade e, acima de tudo, o objetivo de constituir família. Quando esses elementos estão presentes, ela se configura automaticamente, mesmo sem um contrato formal.
Um aspecto relevante é que a união estável não exige que o casal more junto. Muitas vezes, casais em união estável podem viver em cidades ou estados diferentes, seja por motivos de trabalho ou por circunstâncias familiares, como filhos de relacionamentos anteriores.
No entanto, a decisão de morar juntos fortalece a presunção de que o casal tem intenção de formar uma família, dificultando a caracterização do relacionamento como namoro qualificado. “A convivência sob o mesmo teto tende a desqualificar o namoro e configura uma união estável. Recomendo que casais que morem juntos formalizem um contrato”, orienta Dinamarco.
Além disso, a dependência financeira de uma das partes também é um elemento que caracteriza a união. Caso um dos parceiros dependa financeiramente do outro, fica difícil sustentar que se trata apenas de um namoro qualificado, já que a relação assume um caráter de parceria com obrigações patrimoniais.
E o namoro qualificado?
O namoro qualificado é uma alternativa para casais que querem formalizar seu relacionamento sem os efeitos jurídicos de uma UE. Esse tipo de vínculo caracteriza-se por ser uma relação afetiva estável e com algum grau de comprometimento, mas sem o objetivo de constituir família. Normalmente, essa opção é escolhida por pessoas mais maduras e financeiramente independentes, que preferem não dividir responsabilidades patrimoniais.
O contrato de namoro qualificado pode incluir cláusulas que deixem claro que o relacionamento não se destina à constituição de uma família, evitando, assim, as implicações patrimoniais e sucessórias de uma união estável. Esse modelo é válido, especialmente, quando há receio de que o relacionamento possa ser interpretado erroneamente em casos de litígio.
Implicações patrimoniais e sucessórias
A união estável gera direitos e obrigações patrimoniais semelhantes ao casamento civil, e isso inclui a partilha de bens e herança. Em caso de morte de um dos companheiros, o outro é considerado herdeiro necessário, o que lhe garante uma parte do patrimônio. Segundo a lei brasileira, herdeiros necessários são o cônjuge (ou companheiro), descendentes (filhos, netos e bisnetos) e ascendentes (pais e avós). Mesmo na ausência de testamento, esses herdeiros têm direito a uma parcela da herança.
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Por outro lado, no namoro qualificado, o parceiro sobrevivente não é automaticamente considerado herdeiro, salvo se houver um testamento em seu favor. Isso torna o contrato de união estável uma opção mais segura para casais que desejam garantir os direitos sucessórios de um para o outro. A advogada Dinamarco sugere que, além do contrato de união estável, o casal também faça um testamento para definir com clareza os beneficiários do patrimônio.
Transformando um namoro em união estável
Casais que possuem um contrato de namoro qualificado e desejam transformá-lo em uma união estável podem formalizar um novo contrato. Não é necessário anular o contrato de namoro anterior, já que a união estável se sobrepõe a ele. Contudo, vale lembrar que é impossível retroagir os efeitos patrimoniais da união estável para datas anteriores à sua formalização.
Dinamarco explica que, se o casal vive junto há anos, não é permitido aplicar efeitos retroativos para estabelecer o regime de bens da união estável. Portanto, é fundamental que o casal alinhe suas expectativas e formalize o relacionamento no momento oportuno.
União estável e planejamento patrimonial
O contrato de união estável permite uma flexibilidade interessante, que muitas pessoas desconhecem. Ao firmar um contrato, o casal pode estipular regras específicas sobre a partilha de bens, ajustando-as conforme a contribuição financeira de cada um. É possível mesclar diferentes regimes de bens, como a comunhão parcial, excluindo-se determinados bens do patrimônio comum.
Além das questões patrimoniais, o contrato de união estável também pode prever aspectos práticos da convivência, como o tempo para o cônjuge deixar o imóvel em caso de separação, oferecendo segurança e clareza para ambos.
Diferenciar entre união estável e namoro qualificado é essencial para evitar conflitos jurídicos futuros. Embora ambos os modelos formalizem o relacionamento, apenas a união estável gera direitos e deveres patrimoniais e sucessórios. Para casais que buscam proteger seus bens e direitos, o contrato de união estável e o planejamento patrimonial se mostram opções vantajosas, garantindo que os interesses de ambos estejam protegidos.
Entender as nuances jurídicas dessas modalidades de relacionamento permite aos casais tomar decisões informadas e garantir uma segurança maior para o futuro.