Seca histórica: entenda como impacta a economia brasileira

O Brasil enfrenta a pior seca de sua história recente, segundo o Centro Nacional de Monitoramento de Desastres Naturais (Cemaden). A previsão é que as ondas de calor e a estiagem permaneçam em quase todo o país pelo menos até novembro, o que preocupa especialistas e autoridades devido aos impactos econômicos que essa situação pode gerar.

A seca prolongada está afetando não apenas a produção agrícola, mas também a geração de energia elétrica e o transporte de cargas, resultando em uma pressão inflacionária que atinge diretamente o bolso dos brasileiros, especialmente os de menor renda.

Este cenário de crise hídrica traz à tona memórias da seca de 2021, que provocou um aumento significativo nas tarifas de energia e combustíveis, contribuindo para uma inflação de 10,06% naquele ano.

O impacto da seca na geração de energia

Um dos principais reflexos imediatos da seca está na geração de energia elétrica. O Brasil depende fortemente das hidrelétricas, que representam 51,6% da capacidade instalada do país, segundo dados do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

Com a falta de chuvas, os reservatórios estão em níveis críticos, o que levou o governo a acionar a bandeira tarifária vermelha patamar 2, a mais cara, que adiciona R$ 7,88 a cada 100 quilowatt-hora (kWh) consumidos.

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Segundo Gustavo Sozzi, engenheiro e presidente do Grupo Lux Energia, a baixa nos reservatórios obriga o país a recorrer a fontes alternativas de energia, como as termelétricas, que são mais caras e menos eficientes. Isso, por sua vez, aumenta os custos de produção e se reflete na conta de luz dos brasileiros. “O clima desempenha um papel crucial nos preços da energia”, destaca Sozzi, ressaltando que a recuperação dos níveis dos reservatórios dependerá de uma sequência prolongada de chuvas.

Safras comprometidas e alimentos mais caros

A agricultura também sofre os efeitos severos da estiagem. A seca prejudica diretamente as safras, provocando quebras de produção e desabastecimento de diversos produtos agrícolas, o que gera os chamados “choques de oferta”. Esses choques ocorrem quando a disponibilidade de um produto diminui no mercado, levando ao aumento de preços.

Culturas como soja, milho e gado são algumas das mais afetadas, especialmente entre pequenos produtores que não possuem sistemas de irrigação adequados. A agricultura familiar, responsável por grande parte do abastecimento de alimentos no país, é uma das mais prejudicadas. Alexandre Pires, economista do Ibmec, alerta que a situação atual poderá encarecer ainda mais os preços dos alimentos caso a seca persista além de outubro.

Além disso, incêndios causados pela seca no interior de São Paulo podem afetar o preço da cana-de-açúcar, matéria-prima para a produção de açúcar e etanol, embora o impacto deva ser pontual, caso o fogo seja controlado rapidamente.

Logística e transporte prejudicados com a seca

A seca também impacta o transporte de cargas, especialmente na região Norte, onde o nível dos rios está alarmantemente baixo. Isso afeta o escoamento da produção industrial da Zona Franca de Manaus e o transporte de insumos para a indústria no Centro-Sul, especialmente no Sudeste.

O economista Alexandre Maluf, da XP Investimentos, observa que essa interrupção na logística pode causar estresse na cadeia de suprimentos, resultando em uma menor oferta de alguns produtos, como equipamentos eletrônicos e autopeças. Embora esse impacto inflacionário deva ser de curto prazo, ele pode contribuir para uma pressão adicional sobre os preços.

A seca também afeta diretamente a economia local na região Norte, onde muitas comunidades dependem dos rios para transporte e subsistência. Em cidades como Envira, no Amazonas, a estiagem severa já causou desabastecimento de alimentos e atrasos na entrega de insumos médicos, elevando os preços de itens essenciais em mais de 100%.

Pressão sobre a inflação e os juros

A combinação de aumento nos preços de energia, alimentos e dificuldades logísticas resulta em uma pressão inflacionária significativa. Em julho, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulado em 12 meses chegou a 4,5%, atingindo o teto da meta perseguida pelo Banco Central (BC). O centro da meta para 2024 é de 3%, com uma margem de tolerância de 1,5% para mais ou para menos.

A principal ferramenta do Banco Central para controlar a inflação é a taxa Selic, atualmente em 10,5% ao ano. Uma inflação elevada poderia levar o BC a manter ou até aumentar essa taxa, o que encareceria o crédito e reduziria o consumo, afetando a atividade econômica do país.

Alexandre Pires, do Ibmec, afirma que, embora a pressão inflacionária seja uma preocupação, ainda é cedo para prever se o Banco Central ajustará a Selic em resposta à seca. “A decisão do BC levará em conta uma série de fatores, tanto nacionais quanto internacionais, como a tendência de queda dos juros nos Estados Unidos”, explica o economista.

A maior seca da história recente do Brasil apresenta desafios significativos para a economia do país. Com impactos diretos na geração de energia, na produção agrícola e na logística de transporte, os brasileiros podem esperar um aumento nos custos de vida, especialmente em áreas essenciais como alimentos e energia. A situação exige atenção e medidas do governo para mitigar esses efeitos, enquanto o Banco Central observa atentamente a inflação e os juros, equilibrando a estabilidade econômica em um cenário de incertezas climáticas.

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