Tribunal Federal considerou insuficientes as provas para responsabilizar criminalmente as empresas e seus dirigentes pelo desastre em Mariana, mas o Ministério Público anunciou que contestará a decisão
Em decisão proferida nesta quinta-feira, 14 de novembro de 2024, a Justiça Federal absolveu as empresas Samarco, Vale, BHP Billiton e VogBR, além de sete réus, entre eles diretores e gerentes, pelo rompimento da Barragem de Fundão, em Mariana (MG), ocorrido em 2015. O desastre causou a morte de 19 pessoas e danos ambientais imensos. As empresas e os réus foram absolvidos por falta de provas suficientes que ligassem diretamente os envolvidos à responsabilidade criminal. O Ministério Público Federal (MPF) já anunciou que recorrerá da decisão.
Motivos da absolvição
A decisão se baseou na “ausência de provas suficientes para estabelecer a responsabilidade criminal direta e individual de cada réu”. A juíza destacou que, embora houvesse falhas na gestão da Samarco, como omissões de gerentes, não foi possível provar que essas falhas causaram o rompimento da barragem. Por isso, as pessoas físicas e jurídicas envolvidas foram absolvidas.
Defesa dos executivos da Samarco
Ricardo Vescovi de Aragão, presidente da Samarco na época do desastre, também foi absolvido. A defesa dos geotécnicos argumentou que as técnicas de construção e monitoramento da barragem eram as melhores disponíveis e que não houve crime. Segundo a defesa, as falhas ocorreram por circunstâncias que não poderiam ser previstas na época. O tribunal concluiu que não havia provas de negligência ou de intenção de causar danos.
Mudanças no processo
Em 2016, o MPF denunciou 22 pessoas e quatro empresas por homicídios qualificados e crimes ambientais. No entanto, as acusações foram modificadas ao longo do tempo. Em 2019, os crimes de homicídio foram retirados, e alguns crimes ambientais prescreveram, enfraquecendo as acusações. A decisão de absolvição, contudo, não altera o acordo civil firmado, pelo qual as empresas concordaram em pagar R$ 167 bilhões em indenizações às vítimas.
O desastre
O rompimento da barragem de Fundão, em Mariana, ocorreu em 5 de novembro de 2015. O desastre liberou cerca de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de mineração, devastando várias comunidades e afetando o ecossistema. A lama se espalhou, contaminando o Rio Doce e o Oceano Atlântico. Além das 19 mortes confirmadas, 49 municípios foram afetados, com a destruição de áreas de vegetação e fauna, e a poluição de água e solo por metais pesados.
Impactos e reparação lenta
Quase nove anos após o rompimento, os efeitos do desastre ainda são visíveis. Muitas pessoas vivem em condições precárias, aguardando reassentamento e apoio financeiro, enquanto a pesca no Rio Doce segue proibida. Em Bento Rodrigues, um dos vilarejos mais afetados, apenas 156 dos 246 imóveis planejados foram entregues.
Acordos de reparação e controvérsias
Os novos acordos de reparação, totalizando R$ 170 bilhões, também têm sido criticados, com questionamentos sobre o valor ser suficiente para cobrir os danos. O julgamento segue gerando controvérsias, e a decisão de absolvição não foi bem recebida por todos. O MPF já anunciou que recorrerá da sentença.
Ponto de vista do MPF
Para o MPF, a decisão não faz justiça à gravidade do ocorrido e à necessidade de punir os culpados. O órgão acredita que o rompimento não foi um acidente simples, mas resultado de negligência e falhas graves nas práticas de segurança das empresas.
Documentos que aumentam dúvidas
Em julgamento recente em Londres, surgiram documentos mostrando que a BHP, uma das responsáveis pela barragem, já havia previsto em 2010 que o rompimento poderia causar até 100 mortes, com indenizações de US$ 200 mil por vítima. Mesmo assim, a empresa não tomou as medidas preventivas necessárias. Esse fato levanta mais questões sobre as ações das empresas para evitar o desastre.
Posição das empresas sobre o desastre
As empresas afirmam que agiram dentro da legislação vigente na época e tomaram as precauções necessárias para evitar o rompimento. Elas alegam que o ocorrido foi um acidente trágico, mas sem intenção criminosa. Essa posição é mantida nas declarações das empresas, que defendem que o sistema de segurança falhou sem intenção deliberada.
Mudanças na legislação e segurança
Após o rompimento da barragem, a segurança das barragens de mineração em Minas Gerais passou a ser mais questionada. A legislação no estado foi alterada, proibindo a construção de barragens a montante e estabelecendo normas mais rígidas para segurança. A Samarco voltou a operar em 2020, com capacidade reduzida e novos protocolos de segurança, mas ainda há dúvidas sobre a eficácia dessas mudanças.
Alerta para a regulação do setor
O desastre da barragem de Fundão é um marco trágico na história do Brasil e serve como alerta sobre as falhas na regulação da mineração e na fiscalização ambiental. O incidente destacou vulnerabilidades no setor e a necessidade urgente de uma abordagem mais rigorosa para garantir a segurança das barragens e a responsabilização das empresas. Para as vítimas, o caminho para a reparação é longo e difícil, e a busca por justiça continua.
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