O Senado aprovou nesta terça-feira (10), por meio de votação simbólica, a regulamentação da inteligência artificial (IA) no Brasil. Agora, o texto será encaminhado à Câmara dos Deputados para análise.
Durante a tramitação, a proposta gerou divergências, com o relator, senador Eduardo Gomes (PL-TO), apresentando seis versões do relatório. Ele negociou diversas alterações para alinhar o projeto com a oposição, o governo e representantes do setor de tecnologia.
Antes da votação, o líder do governo no Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP), e artistas se reuniram com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG).
O encontro teve como objetivo garantir que a remuneração dos direitos autorais fosse mantida no projeto, um ponto que foi questionado pela oposição.
A proposta havia sido aprovada na semana passada pela comissão interna que a analisava, após vários adiamentos. A votação no plenário estava inicialmente prevista para o mesmo dia, mas, a pedido da oposição, foi remarcada para esta quarta-feira.
A análise do projeto estava bloqueada na comissão desde o início do ano devido à resistência da oposição, que argumentava que a proposta restringiria o desenvolvimento tecnológico e limitaria a liberdade de expressão.
O governo, embora apoiasse o projeto, fez demandas conflitantes, o que dificultou o andamento, conforme explicou o relator.
Esses obstáculos atrasaram a discussão da proposta, que também tem gerado pressão de grandes plataformas digitais, as chamadas big techs.
O projeto estabelece os riscos e os direitos envolvidos no uso e desenvolvimento de IAs no Brasil. Em seu parecer, o relator mencionou que buscou equilibrar a proteção dos direitos fundamentais com a promoção do desenvolvimento tecnológico.
A proposta está em tramitação desde o ano passado e é considerada prioritária pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), autor do projeto principal que está sendo analisado pela comissão. O texto se baseia em um anteprojeto criado por uma comissão de juristas formada por Pacheco.
Inteligência Artificial
O projeto define os conceitos de sistemas de inteligência artificial, agentes de IA (como desenvolvedores, distribuidores e aplicadores da tecnologia) e “conteúdos sintéticos” — como imagens, vídeos, áudios e textos, que foram alterados ou gerados por IA.
Também é estabelecido que um sistema de IA é considerado de “alto risco” quando tem o potencial de causar impactos negativos a indivíduos ou grupos. Exemplos disso incluem dispositivos usados em infraestruturas críticas, processos de seleção e avaliação, administração da justiça, veículos autônomos em espaços públicos, saúde, entre outros.
A proposta cria o Sistema Nacional de Regulação e Governança de Inteligência Artificial (SIA), que será coordenado pela Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD).
Um dos pontos principais do projeto é a previsão de compensação pelo uso de conteúdos protegidos por direitos autorais e conexos. Esse pagamento deverá ser feito pelo “agente de IA” que utilizar esses conteúdos para treinar ou desenvolver sistemas de IA.
Além disso, o uso de conteúdos como imagens, áudio, voz ou vídeo que retratem ou identifiquem pessoas deve respeitar os direitos da personalidade.
Uso de IA e dados pessoais na propaganda eleitoral: limites do TSE
O uso de inteligência artificial (IA) nas campanhas eleitorais brasileiras tem transformado a maneira como os candidatos se comunicam com o eleitorado, oferecendo ferramentas para personalizar mensagens, segmentar públicos específicos e otimizar o alcance das propagandas.
Além disso, a IA permite a coleta e o processamento de grandes volumes de dados pessoais dos eleitores, criando uma abordagem mais precisa e eficiente nas estratégias de marketing eleitoral.
No entanto, essas inovações também trazem riscos significativos para a democracia, como a disseminação de desinformação, a criação de deepfakes e o microtargeting abusivo.
Riscos e desafios
A criação de deepfakes, que são conteúdos audiovisuais manipulados pela IA para simular eventos ou falas que nunca ocorreram, é uma das maiores ameaças.
Esses vídeos ou áudios altamente realistas podem ser usados para difundir mentiras sobre candidatos ou manipular a opinião pública, dificultando a identificação do conteúdo falso e colocando em risco a imparcialidade do processo eleitoral.
Outro risco é a disseminação acelerada de desinformação. A automação proporcionada pela IA pode gerar uma grande quantidade de informações falsas ou distorcidas em um curto período, impactando negativamente o debate público e minando a confiança do eleitorado nas instituições democráticas. Além disso, o uso de dados pessoais para microtargeting, visando explorar vulnerabilidades psicológicas e influenciar comportamentos eleitorais, levanta sérias questões sobre privacidade e manipulação ética.
Regulamentações do TSE
Em resposta a esses desafios, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) adotou uma série de resoluções, como a Resolução 23.610/2019, que estabelece regras claras para o uso de IA e dados pessoais nas campanhas eleitorais.
A Resolução exige que qualquer conteúdo gerado por IA, como vídeos, imagens ou áudios manipulados, seja claramente identificado como tal.
Isso pode ser feito por meio de marcas d’água em vídeos e imagens, ou avisos no início de áudios, com o objetivo de garantir transparência e evitar a manipulação do eleitor.
Além disso, o TSE proíbe o uso de chatbots e avatares para simular conversas com candidatos ou outras figuras públicas, uma medida que visa evitar enganos e manipulações.
A resolução também exige que os conteúdos sintéticos, como vídeos e imagens criados por IA, sejam rotulados de forma acessível, seja para plataformas digitais ou para conteúdos impressos, de modo que o eleitor possa identificar facilmente o que foi alterado.
Impacto no tratamento de dados pessoais
Outro aspecto importante é o tratamento de dados pessoais. A Resolução determina que candidatos e partidos devem informar aos eleitores sobre o uso de dados públicos para fins eleitorais e garantir a possibilidade de o eleitor se opor a esse uso. Importante, os dados sensíveis, como filiação partidária ou religião, exigem consentimento explícito para o seu uso em campanhas, e o TSE proíbe a utilização de dados sem a devida autorização.
A manipulação psicológica eleitoral também é proibida pela Resolução 23.610/2019. O artigo 10 proíbe o uso de meios publicitários destinados a criar, artificialmente, estados mentais ou emocionais na opinião pública, especialmente por meio de conteúdo gerado ou alterado pela IA.
Isso visa combater a manipulação de eleitores por meio de informações falsas ou distorcidas, que poderiam influenciar de maneira indevida os resultados eleitorais.
Leia também: Senado aprova cobertura de acompanhante no parto