Brasil descarta moeda única do Brics, mas busca reduzir uso do dólar

O Brasil, durante sua presidência do Brics em 2025, não vai sugerir a criação de uma moeda única para o grupo, mas pretende conectar os sistemas de pagamento dos países membros. Isso significa facilitar as transações entre os países, incentivando o comércio, atraindo investimentos e usando mais as moedas locais, sem depender tanto do dólar, de acordo com fontes em conversa com a Reuters.

Brasil busca alternativas para reduzir dependência do dólar.
Os BRICS foram criados em 2009 com o objetivo de promover a cooperação econômica, política e social entre seus países membros |Foto: Reprodução/Michele Spatari/ AFP

O presidente Lula acredita que é importante discutir maneiras de negociar sem depender apenas do dólar. O plano é usar novas tecnologias, como o blockchain — um tipo de banco de dados digital seguro e transparente que registra todas as transações de forma permanente —, para baratear e agilizar essas operações.

Essa iniciativa não busca causar conflitos, especialmente com os Estados Unidos, liderados por Donald Trump, mas sim oferecer mais alternativas para os países. O Brasil, que já teve sucesso com o Pix, quer expandir seu Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML) para tornar as transferências internacionais mais rápidas, seguras e baratas.

Alternativas à moeda única

As discussões técnicas do grupo formado por Brasil, Rússia, Índia, China, África do Sul, Egito, Etiópia, Irã, Emirados Árabes Unidos, Arábia Saudita e Indonésia nunca consideraram a criação de uma moeda comum, segundo todas as fontes consultadas.

A ideia de alternativas ao uso de moedas tradicionais, como o dólar, ganhou força após as sanções impostas pelo Ocidente à Rússia devido à guerra na Ucrânia.

Nos últimos dias, o Ministério da Fazenda e o Banco Central do Brasil discutiram as propostas que serão apresentadas pelo país durante sua presidência no Brics em 2025, com foco em pagamentos transfronteiriços. Ambos os órgãos foram procurados, mas não comentaram.

Os representantes do grupo se reuniram na África do Sul no final de fevereiro, paralelamente ao G20, para que o Brasil apresentasse o plano aos demais membros.

Sem antagonismo

A busca dos países do Brics por melhorias na eficiência dos pagamentos transfronteiriços se apresenta como uma estratégia cuidadosa para evitar antagonismos, especialmente com o presidente dos EUA, Donald Trump, conhecido por seu posicionamento firme contra qualquer movimento que ameace a hegemonia do dólar como moeda de reserva global.

Essa estratégia se baseia no uso de novas tecnologias, como o blockchain, visando a redução de custos de transação. Embora um possível efeito colateral seja a menor dependência do dólar, este não é o objetivo principal, mas sim a eficiência financeira.

“A narrativa de reduzir custos e ser mais eficiente no custo de transação não é contra ninguém”, destacou uma fonte.

Outro interlocutor ressaltou que, embora os países do Brics estudem alternativas, não há intenção de eliminar o dólar de suas reservas.

No final de janeiro, Trump ameaçou impor tarifas de 100% aos membros do Brics caso criassem uma moeda comum ou apoiassem outra moeda para substituir o dólar, descrevendo-os como “aparentemente hostis”. Apesar disso, os países mantêm a postura de exploração de alternativas sem intenção de confronto.

O papel de destaque do Brasil

O Brasil tem se destacado como protagonista na modernização dos sistemas de pagamento globais, impulsionado pelo sucesso do Pix. Desde sua criação, o Pix tornou-se o meio de pagamento mais utilizado no país, superando o uso de dinheiro e cartões. A interconexão de sistemas para barateamento e fluidez de pagamentos internacionais é uma pauta defendida pelo governo brasileiro, especialmente durante sua presidência do G20 em 2023.

Gabriel Galípolo, novo presidente do Banco Central, ressaltou o potencial do Pix para integração com outros sistemas de pagamento, embora desafios de governança ainda precisem ser superados. O Sistema de Pagamentos em Moeda Local (SML), já em operação com Argentina, Uruguai e Paraguai, permite transações diretamente em reais, sem a intermediação do dólar, embora seu uso ainda seja limitado e as liquidações demorem até três dias úteis.

Em 2023, as movimentações via SML entre Brasil e Argentina alcançaram 5,13 bilhões de reais, uma fração pequena diante dos 155 bilhões de reais movimentados no comércio total entre os dois países. Fontes apontam que a adoção de tecnologias de pagamentos instantâneos pode tornar essas transações mais seguras, rápidas e acessíveis, ampliando o protagonismo brasileiro no cenário financeiro internacional.

Trump ameaçou impor tarifas de 100% aos Brics se tentassem substituir o dólar

Em janeiro deste ano, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, reforçou sua postura agressiva em relação às tarifas e às relações comerciais internacionais, destacando que os países do BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) devem comprometer-se a não substituir o dólar americano nas transações internacionais. Em uma postagem em sua rede social, Truth Social, Trump afirmou que qualquer nação que tente substituir a moeda americana enfrentará tarifas de 100%.

Trump ainda declarou que os EUA exigirão uma confirmação de que os membros do BRICS não apoiarão a criação de uma nova moeda para o bloco, nem facilitarão a substituição do dólar. “Não há chance de que o BRICS substitua o dólar dos EUA no comércio internacional, ou em qualquer outro lugar, e qualquer país que tentar deve dizer olá para as tarifas e adeus para a América”, escreveu o presidente republicano.

Em reação às ameaças de Trump, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou que o Brasil responderia com “reciprocidade” caso os Estados Unidos aumentassem as tarifas sobre os produtos brasileiros. Lula garantiu que o Brasil não hesitaria em aplicar tarifas sobre as exportações americanas, caso a situação exigisse, reforçando o tom de firmeza nas negociações comerciais entre os dois países.

Outras ameaças tarifárias de Trump

Além das ameaças dirigidas ao BRICS, Trump também ampliou suas sanções tarifárias a outros países, incluindo a China, a União Europeia, o Canadá e o México. Trump afirmou que, imporia tarifas de 25% sobre as importações do Canadá e do México, citando preocupações com o fluxo de fentanil, a entrada de imigrantes ilegais e déficits comerciais como justificativas. No caso do petróleo, um dos principais produtos importados dos vizinhos, Trump indicou que poderia isentar o produto da tarifa, dependendo dos preços internacionais.

Barreiras contra a China

Trump também abordou a situação com a China, prometendo novas tarifas contra o país, devido ao não cumprimento de acordos relacionados ao controle do fentanil e outros produtos químicos prejudiciais aos Estados Unidos. O presidente americano sinalizou que está preparado para seguir com a implementação de tarifas adicionais, que poderiam impactar ainda mais as relações comerciais entre as duas potências.

Essas movimentações fazem parte de uma estratégia mais ampla de Trump para proteger a economia dos EUA e manter sua posição dominante no comércio global, com a promessa de novas barreiras tarifárias em diversos setores.

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