A matemática básica, que inclui operações simples como tabuada e soma de três dígitos, ainda é um desafio para muitas crianças brasileiras. Um estudo internacional recente revelou que 51% dos alunos de 9 anos no Brasil não conseguem resolver problemas matemáticos básicos.
O dado alarmante faz parte do Estudo Internacional de Tendências em Matemática e Ciências (Timss), que avaliou o desempenho de estudantes em 64 países.
Esta é a primeira vez que o Brasil participa da avaliação, aplicada a cada quatro anos desde 1995. A média dos alunos brasileiros foi de 400 pontos, uma das mais baixas, à frente apenas de Marrocos, Kuwait e África do Sul.
Em comparação, a média global é 7de 503 pontos, o que coloca o país três anos escolares atrás de nações com desempenho médio.
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Desafios no ensino de matemática
Segundo Ernesto Martins Faria, especialista em políticas públicas educacionais, o resultado do Brasil revela a gravidade da situação educacional. “Crianças de 9 anos já enfrentam um atraso enorme. Nossa média se aproxima de países africanos com PIB muito inferior ao nosso”, aponta.
O estudo também mostrou que os alunos com o pior desempenho (5% do total) atingiram no máximo 259 pontos, evidenciando que muitas crianças simplesmente não conseguem resolver as questões propostas.
Para Faria, o nível de dificuldade do Timss, superior ao do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb), deveria inspirar mudanças no currículo.
“Precisamos de uma régua mais alta. Atualmente, as redes de ensino guiam-se por avaliações menos exigentes. Uma combinação entre o básico e conteúdos mais complexos é essencial para melhorar a qualidade do ensino”, afirma.
A matemática no 8º ano: mais desafios
Entre os jovens de 13 anos, a situação também é preocupante. Cerca de 62% dos alunos não alcançam o nível mínimo em conceitos como formas geométricas básicas, relações de proporção e leitura de gráficos. A média nacional para essa faixa etária foi de 378 pontos, uma das mais baixas entre os países avaliados.
“Essa defasagem prejudica não só o aprendizado acadêmico, mas também as habilidades práticas necessárias para a vida adulta”, avalia Émerson de Pietri, professor da USP.
Causas da defasagem
- Formação docente inadequada: muitos professores entram no mercado de trabalho com lacunas no próprio aprendizado. Além disso, os cursos de licenciatura em matemática enfrentam baixa procura e alta evasão, devido à falta de atratividade da carreira.
- Condições socioeconômicas: o Brasil ainda lida com desigualdades históricas, como o impacto de séculos de escravidão e o recente acesso universal ao ensino fundamental. Crianças em situação de vulnerabilidade socioeconômica muitas vezes enfrentam barreiras para aprender, desde a falta de comida até escolas com infraestrutura precária.
- Falta de incentivo à matemática no dia a dia: enquanto a leitura é estimulada em diversas atividades cotidianas, como mensagens de texto ou livros, a matemática depende diretamente do ambiente escolar.
Possíveis soluções
Especialistas apontam que um dos caminhos para reverter esse quadro é investir na formação de professores. “Melhorar os cursos de pedagogia e licenciatura em matemática é crucial. Além disso, precisamos valorizar a profissão com melhores salários e condições de trabalho”, sugere Faria.
Outro ponto seria adaptar o currículo escolar para incorporar questões mais desafiadoras, com base nos padrões internacionais. Países com bom desempenho no Timss, como Cingapura e Finlândia, investem em abordagens que combinam teoria com aplicação prática.
A matemática em ciências
Apesar de a matemática apresentar o maior desafio, o estudo também revelou problemas em ciências. No 4º ano, 39% das crianças brasileiras não dominam conceitos básicos sobre plantas, animais e meio ambiente. No 8º ano, 42% não conseguem distinguir entre reações químicas e físicas ou identificar células e tecidos.
Embora os resultados sejam ligeiramente melhores do que em matemática, eles ainda indicam lacunas significativas no ensino das ciências no Brasil.
Os resultados do Timss colocam em evidência a urgência de mudanças no sistema educacional brasileiro. Investir na formação de professores, melhorar o currículo escolar e oferecer suporte a alunos em situação de vulnerabilidade são passos fundamentais para preparar as crianças para um futuro mais promissor.
A matemática básica é a base para o aprendizado de diversas áreas do conhecimento. Garantir que as crianças dominem essas habilidades é um compromisso que o Brasil precisa assumir com urgência.