90 milhões de brasileiros sem saneamento básico: desafios e soluções

Segundo o Ranking do Saneamento divulgado pelo Instituto Trata Brasil, cerca de 90 milhões de brasileiros ainda vivem sem acesso ao saneamento básico, ou seja, quase metade da população do país. Além de ser um direito essencial, a ausência desse serviço afeta diretamente a saúde, a qualidade de vida e o desenvolvimento econômico do Brasil. Com a meta de universalizar o saneamento até 2033, conforme prevê a Lei nº 14.026/2020, o país enfrenta desafios significativos.

A nova legislação, conhecida como Novo Marco do Saneamento, exige que 90% da população tenha acesso à coleta e tratamento de esgoto nos próximos anos, mas alcançar esse objetivo demanda soluções urgentes e eficazes.

Leia também: Como pequenos atos sociais ajudam a combater a solidão e melhorar a saúde?

Licenciamento ambiental: um dos principais entraves

De acordo com a Fundação Dom Cabral (FDC), o processo de licenciamento ambiental é um dos maiores obstáculos para a construção de Estações de Tratamento de Esgoto (ETEs). Apesar de necessárias para a despoluição de rios e áreas costeiras, as ETEs enfrentam barreiras burocráticas, com processos de licenciamento que podem levar até cinco anos. Segundo o professor Adriano Candido Stringhini, da FDC, é essencial simplificar esse procedimento para agilizar a implementação das ETEs, sem abrir mão do rigor técnico necessário.

O estudo técnico “Despoluição das águas interiores e costeiras do Brasil”, elaborado em parceria com o Instituto Trata Brasil, sugere a criação de um processo de licenciamento ambiental mais ágil. Esse modelo busca garantir que as ETEs entrem em funcionamento rapidamente, enquanto os órgãos responsáveis realizam o monitoramento contínuo para assegurar a qualidade das águas.

O saneamento básico é uma das principais chaves para o desenvolvimento sustentável do Brasil | Foto: Reprodução/Canva
O saneamento básico é uma das principais chaves para o desenvolvimento sustentável do Brasil | Foto: Reprodução/Canva

Saneamento como fator de desenvolvimento sustentável

Investir em saneamento básico não se resume apenas a uma questão de infraestrutura; os benefícios vão além da saúde e do meio ambiente. Em termos econômicos, o saneamento básico também valoriza propriedades e atrai investimentos para as regiões. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), cada real investido em saneamento resulta em uma economia de até quatro reais em saúde, graças à redução de doenças de veiculação hídrica, como diarreia e dengue.

Além disso, a falta de saneamento básico contribui para a emissão de gases de efeito estufa. Rios e lagoas poluídos são fontes significativas de metano e outros gases prejudiciais ao clima. Portanto, o avanço no saneamento básico também contribui para os compromissos do Brasil em reduzir as emissões e promover a sustentabilidade.

Inovação tecnológica como resposta para áreas isoladas

Em territórios rurais, indígenas, quilombolas e em regiões remotas, o desafio de implementar o saneamento é ainda maior. A falta de infraestrutura e a distância das redes convencionais de tratamento tornam a implantação do saneamento nesses locais especialmente complexa. Contudo, novas soluções tecnológicas surgem como alternativas promissoras.

Estudos realizados pelo Instituto Trata Brasil indicam que tecnologias compactas, como estações de tratamento em contêineres, podem oferecer uma solução prática e econômica para o saneamento em áreas de difícil acesso. Esse tipo de estação trata a água e os esgotos de forma eficiente e pode ser implantado de maneira rápida, beneficiando comunidades isoladas que enfrentam dificuldades para obter acesso à rede de saneamento convencional.

Educação ambiental para conscientizar a população

Outro aspecto fundamental para avançar no saneamento básico é a educação ambiental. Em algumas regiões, mesmo onde há infraestrutura disponível, muitas pessoas ainda não conectam suas casas às redes de esgoto, seja por falta de informação, seja por questões culturais. Para contornar essa situação, especialistas defendem campanhas de conscientização que esclareçam os benefícios coletivos do saneamento básico e incentivem a população a aderir ao serviço.

A pandemia de COVID-19 evidenciou como a saúde pública é interdependente, e o saneamento básico é essencial para evitar surtos de doenças transmissíveis. O investimento em educação ambiental é, portanto, uma estratégia essencial para garantir o uso correto das redes de esgoto e melhorar a qualidade de vida da população.

Desafios fiscais e institucionais

Além das questões técnicas e de conscientização, o setor de saneamento básico enfrenta desafios financeiros e institucionais. Com a Reforma Tributária em curso, existe o risco de aumento dos tributos para o setor, o que poderia dificultar a viabilidade econômica dos projetos. Isso impacta especialmente os municípios menores e mais pobres, que já encontram dificuldades para estruturar e financiar seus projetos de saneamento.

Para superar esses obstáculos, o fortalecimento institucional dos órgãos de fiscalização e licenciamento é fundamental. A proposta do estudo da FDC inclui melhorias nas condições de trabalho, aumento de pessoal e treinamento técnico dos profissionais envolvidos no licenciamento ambiental. Segundo Adriano Stringhini, essas mudanças são essenciais para que os processos fluam de maneira adequada e contribuam para a ampliação do saneamento no país.

O caminho para a universalização até 2033

Embora o objetivo de universalizar o saneamento básico até 2033 seja ambicioso, especialistas acreditam que é possível atingi-lo, desde que haja empenho em desburocratizar os processos, incentivar o investimento privado e promover a inovação. No entanto, o Brasil ainda precisa de bilhões em investimentos anuais para alcançar essa meta. Para Stringhini, é essencial adotar uma abordagem criativa e prática, focando em soluções de baixo custo e tecnologias emergentes para acelerar o ritmo dos projetos.

O Novo Marco do Saneamento cria oportunidades para o setor, ao estabelecer metas claras e previsíveis. Contudo, a efetiva implementação dessas metas depende da capacidade dos governos federal, estadual e municipal de criar condições favoráveis para que o setor privado e os bancos de fomento possam participar desses projetos de forma eficaz e com segurança jurídica.

O saneamento básico é uma das principais chaves para o desenvolvimento sustentável do Brasil. Além de garantir a saúde e a qualidade de vida da população, sua ampliação trará benefícios econômicos e ambientais significativos para o país. Com planejamento, investimento e uma visão integrada que envolva o setor público e privado, é possível transformar a realidade de milhões de brasileiros que ainda vivem sem esse serviço essencial.

Atualize-se.
Receba Nossa Newsletter Semanal

Sugestões para você