Apesar do sucesso, o mercado editorial de livros lida com queda no volume de vendas e aumento de preços
A 27ª Bienal do Livro aconteceu entre os dias 6 e 15 de setembro, no estado de São Paulo, reunindo cerca de 722 mil pessoas ao longo desses 10 dias, tornando-se a edição mais concorrida dos últimos 10 anos. O grande número de visitantes levantou uma questão entre os livreiros presentes no evento: “Onde estão todos esses leitores no restante do ano?”
O clima era de celebração e otimismo devido ao expressivo crescimento no faturamento, com a média diária dos expositores, com um aumento de 83% em comparação a 2022 que já havia sido um ano bastante positivo. Esse salto, no entanto, contrasta fortemente com o cenário mais amplo do mercado editorial, o qual enfrenta desafios significativos.
Crescimento do setor editorial não se reflete na venda de livros
De acordo com um relatório da consultoria Nielsen, o setor editorial apresentou um crescimento de 7% em receita nos primeiros seis meses de 2024, em relação a 2023. No entanto, esse crescimento não reflete um aumento no consumo de livros, mas sim um reajuste nos preços, que subiram 11%.
Ao mesmo tempo, o número de exemplares vendidos caiu 4%, indicando uma retração no volume de vendas. Além disso, o atraso nas compras governamentais de livros, um fator crucial para o mercado, tem gerado ainda mais preocupação entre os profissionais do setor, reforçando o caráter instável e alarmante dessa situação.
Será que os leitores estão deixando as compras de livros exclusivamente para eventos de grande porte, como a Bienal? Na verdade, há diversas outras questões a serem consideradas.
Mariana Bueno, coordenadora na Nielsen, lembra que “se antes o país tinha redes de livrarias com capilaridade, o cenário hoje é outro. Alguns livreiros estão investindo em expansão, mas isso leva tempo”. O leitor se deparar com vitrines pela cidade, favorece a compra espontânea de livros.
“A venda na internet funciona mais para buscas ativas, não para conhecer lançamentos”, afirma a coordenadora. “A classe C, que é compradora de livros e não está no centro das cidades, é parte da demanda que não está sendo atendida hoje.”
Novos hábitos de consumo
Cassiano Elek Machado, diretor do grupo Record, ressalta que o recente crescimento representa mais do que números, sinalizando uma mudança significativa nos hábitos e nas preferências de consumo do público, apontando para novas tendências no mercado.
“Embora ainda tenhamos excelentes livrarias, isso reflete a mudança do sistema Cultura-Saraiva-FNAC para o da Amazon. Um determinado público deixou de ter contato físico com o livro. Antes as pessoas iam de ônibus só para passear na Cultura da Paulista.”
A Bienal do Livro se transforma agora em uma oportunidade para que amigos e famílias possam juntos expandir seus horizontes de leitura. De acordo com uma pesquisa realizada durante o evento, 45% dos visitantes vêm de fora da capital, com 7% deles provenientes de outros estados.
Dessa forma, não é por acaso que o foco do evento se volta cada vez mais para o público jovem que tem mais facilidade em se organizar em grupos para encontrar seus ídolos literários. A programação é cuidadosamente pensada para atrair “fandoms”, os espaços são visualmente atraentes e altamente instagramáveis, e os influenciadores digitais, por vezes, acabam se tornando uma das principais atrações.
“Não consigo parar de me surpreender com a força que o TikTok deu ao livro”, reforça Machado. “E a cultura do ‘booktok’ é do livro físico, é uma relação de colecionismo.”
Bruno Zolotar, diretor de marketing da Rocco, afirma que atualmente as editoras que apresentam crescimento mais modesto nas bienais são aquelas que investem menos no público jovem, o qual representa o futuro da base de leitores. Ele ressalta que eventos desse tipo demonstram claramente que existe uma demanda reprimida por livros.
“Hoje há bairros inteiros sem um único ponto de venda. Como pegar isso tudo e levar para a livraria da cidade?”
Contém informações publicadas na Folha de São Paulo