Entenda os fatores por trás do cenário econômico de outubro de 2024

O Brasil apresenta perspectivas de crescimento econômico para 2024, mas o mercado financeiro segue apreensivo. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), a expectativa de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro aumentou para 3%, mas fatores externos e internos, como a política fiscal e o fortalecimento do dólar, têm gerado um cenário de incertezas.

Especialistas indicam que, mesmo com a expansão econômica, a situação das contas públicas e a dívida nacional são razões para preocupações. A seguir, analisamos os principais fatores que afetam o mau humor do mercado e como eles influenciam os ativos brasileiros.

Fatores internos: o peso das contas públicas e da dívida

No Brasil, o cenário fiscal tem sido um dos principais fatores que geram tensão para os investidores. O economista-chefe da G5 Partners, Luis Otávio Leal, compara a situação econômica a um “acidente de avião”, que geralmente é causado por uma série de fatores combinados, e não apenas por um.

No caso brasileiro, o foco está no elevado endividamento público e na ausência de previsões para estabilização da dívida. Segundo o Banco Central, as projeções indicam que a dívida bruta pode ultrapassar 90% do PIB até 2032, um nível elevado para um país emergente. Esse cenário gera insegurança nos investidores, que exigem rendimentos maiores para compensar o risco de financiamento de um governo endividado.

A diretora de macroeconomia do UBS Global Wealth Management no Brasil, Solange Srour, enfatiza que déficits fiscais persistentes aumentam a preocupação dos investidores. Além disso, as metas de superávit primário prometidas pelo governo para os próximos anos estão sendo questionadas.

Embora o governo preveja um superávit primário de 0,25% do PIB para 2026, analistas duvidam que o Brasil conseguirá manter esse compromisso, especialmente devido à elevação das despesas obrigatórias, que vêm pressionando o orçamento público.

Impacto externo: dólar fortalecido e cenário global adverso

Dólar - Simone Biles - PIB - fatores
Dólar volta a ficar em alta durante a semana por consequência de suposições políticas | Foto: Reprodução/Canva

O cenário internacional também afeta a economia brasileira. A valorização do dólar, impulsionada pela expectativa de um possível retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos e pela política monetária do Federal Reserve (Fed), enfraquece o real e gera pressão sobre o mercado local.

Recentemente, o Fed reduziu a taxa de juros para a faixa entre 4,75% e 5%, mas analistas indicam que o banco central americano pode manter os juros altos por mais tempo do que o mercado esperava. Essa postura do Fed tem um impacto direto sobre o fluxo de capitais para países emergentes, como o Brasil, que se tornam menos atraentes para os investidores internacionais em um cenário de juros elevados nos Estados Unidos.

Com a projeção de uma vitória de Trump, o mercado avalia que sua política econômica pode aumentar a inflação nos Estados Unidos, o que forçaria o Fed a manter juros mais altos para conter os preços. Alessandra Ribeiro, diretora de macroeconomia da Tendências Consultoria, explica que o retorno de Trump poderia trazer inflação por meio de tarifas de importação e restrições à imigração, criando um mercado de trabalho mais restrito. Esses fatores elevam a percepção de risco para economias emergentes e afetam o real, resultando em um dólar mais forte, o que por sua vez aumenta a pressão sobre o Banco Central brasileiro.

China e commodities: reflexos da desaceleração chinesa

A economia chinesa, uma das principais parceiras comerciais do Brasil, enfrenta dificuldades para alcançar sua meta de crescimento de 5% para este ano, o que afeta a demanda por commodities brasileiras. O Brasil é um grande exportador de produtos como soja e minério de ferro para a China e tende a sentir os efeitos de uma desaceleração econômica no gigante asiático. Como resultado, a desvalorização das commodities impacta a balança comercial brasileira, limitando uma das principais fontes de receita do país.

Desconfiança no arcabouço fiscal e nas políticas parafiscais

O governo brasileiro tem adotado medidas para impulsionar o crédito, recorrendo a políticas parafiscais e ao uso de fundos públicos e privados. Essas ações, apesar de não impactarem diretamente o resultado primário, têm gerado receio no mercado quanto à sustentabilidade do arcabouço fiscal. O aumento das despesas obrigatórias coloca pressão sobre o orçamento, reduzindo a margem para investimentos discricionários. O governo anunciou uma meta de equilíbrio fiscal para 2024 e 2025 e uma possível criação de superávit para 2026, mas a credibilidade dessas metas ainda é questionada por economistas.

Solange Srour aponta que a condução fiscal do governo tem preocupado o mercado, especialmente em um momento em que o Banco Central adota uma política de juros altos para controlar a inflação. A expectativa dos analistas do relatório Focus é que a taxa básica de juros, a Selic, encerre 2024 em 11,75%, um nível superior ao projetado no início do ano. Essa desconexão entre a política fiscal e a política monetária eleva o custo de financiamento para empresas e famílias, impactando o consumo e o investimento, elementos essenciais para o crescimento econômico.

Leia também: Relatório Focus: previsão da inflação sobe para 4,55%

Inflação e a política monetária: desafios para o Banco Central

A inflação segue sendo um desafio para o Banco Central. O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) apresenta previsão de 4,55% para 2024, acima da meta de 4,5%, e as projeções para os próximos anos também permanecem fora dos parâmetros estipulados. Essa realidade levou o Comitê de Política Monetária (Copom) a aumentar a taxa Selic para 10,75%, com a possibilidade de mais altas, caso as expectativas de inflação continuem acima da meta de 3%.

A futura gestão de Gabriel Galípolo no Banco Central gera incertezas quanto à independência da instituição, especialmente com a proximidade das eleições presidenciais em 2026. O mercado aguarda para ver como Galípolo conduzirá a política monetária, mas a expectativa é de que o BC continue perseguindo a meta inflacionária.

Embora o Brasil esteja em uma trajetória de crescimento, o cenário de mau humor do mercado financeiro reflete preocupações estruturais. O aumento do endividamento público, o fortalecimento do dólar, a desaceleração da China e as incertezas políticas internas e externas compõem um cenário de desafios que, apesar do crescimento do PIB, coloca o Brasil em uma posição vulnerável no mercado global. A estabilidade econômica exigirá um compromisso contínuo do governo com o equilíbrio fiscal e a gestão das políticas monetária e fiscal de maneira coesa.

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