Juros sobem novamente com incertezas fiscais e externas

As taxas de juros futuros no Brasil voltaram a subir nesta quinta-feira, 10 de outubro, refletindo um cenário de incerteza que envolve tanto questões externas quanto o contexto fiscal doméstico. Após já terem atingido os maiores níveis desde março de 2023 no dia anterior, as taxas mantiveram a trajetória ascendente, sem um fator determinante, mas impulsionadas por uma combinação de riscos globais e preocupações fiscais locais.

Os contratos de Depósito Interfinanceiro (DI) de longo prazo registraram avanços significativos. O DI para janeiro de 2026, por exemplo, fechou com taxa de 12,55%, em comparação aos 12,50% do dia anterior, enquanto o DI para janeiro de 2027 subiu de 12,59% para 12,66%. Essas oscilações refletem as expectativas de que a Selic pode continuar em um patamar elevado, ou até ser ajustada para cima, caso a conjuntura fiscal não se estabilize.

Como a alta das taxas de juros tem impacto externo

A dinâmica internacional teve um papel fundamental na alta das taxas. O mercado norte-americano, com expectativas mais conservadoras quanto aos cortes de juros pelo Federal Reserve, adicionou incertezas.

A divulgação do índice de inflação ao consumidor (CPI) acima do esperado nos Estados Unidos foi compensada pela leve alta nos pedidos semanais de auxílio-desemprego, o que inicialmente alimentou apostas de corte de 25 pontos-base na próxima reunião do Fed, em novembro. Entretanto, declarações do presidente da distrital de Atlanta, Raphael Bostic, sugerindo a manutenção dos juros, reverteram essas apostas, elevando os rendimentos dos títulos do Tesouro dos EUA (Treasuries).

Com a T-Note de 10 anos superando 4,10%, o cenário global tornou-se mais incerto, pressionando também as taxas de juros no Brasil. O aumento da probabilidade de um único corte de 25 pontos-base nos EUA até o final do ano contribuiu para a cautela nos mercados de renda fixa.

Cenário fiscal no Brasil: reforma do Imposto de Renda e preocupações

No Brasil, o mercado ainda tenta digerir a proposta da Fazenda de ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF) para até R$ 5 mil. Embora a medida tenha sido recebida com otimismo por parte dos contribuintes, a ausência de clareza sobre como será feita a compensação fiscal preocupa investidores. O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, confirmou que o governo apresentou ao presidente Lula quatro cenários para a reforma tributária, que incluem a tributação mínima de grandes fortunas e a isenção de pessoas físicas até o teto de R$ 5 mil.

Haddad afirma que o governo apresentou ao presidente Lula quatro cenários para a reforma tributária | Foto: Reprodução / Agência Brasil

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Haddad afirma que o governo apresentou ao presidente Lula quatro cenários para a reforma tributária | Foto: Reprodução / Agência Brasil

Economistas destacam que a elevação da faixa de isenção deverá ser compensada por meio de novas receitas, segundo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). De acordo com cálculos da Warren, uma das opções seria aplicar uma taxa de 12% sobre a renda de quem ganha mais de R$ 1 milhão por ano, o que poderia gerar uma arrecadação de R$ 44,8 bilhões.

Entretanto, a falta de detalhes concretos sobre a reforma tributária gera apreensão no mercado. A preocupação é que o possível desequilíbrio fiscal force o Banco Central a manter a Selic em níveis elevados por mais tempo para controlar a inflação e garantir a sustentabilidade das contas públicas.

Projeções para a Selic: novas elevações à vista?

Com as incertezas internas e externas pressionando o mercado, as projeções para a Selic indicam uma alta adicional. No mercado, já se precificam 58 pontos-base de elevação para a reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) de novembro, o que aponta para uma chance de 30% a 35% de um ajuste de 75 pontos-base, e uma probabilidade de 65% a 70% de um aumento de 50 pontos-base.

A curva de juros precifica uma Selic de até 13,35% no final do ciclo de alta, um reflexo direto dos prêmios de risco exacerbados na curva de juros. Para o estrategista da Traad, Leonardo Cappa, o mercado pode estar superestimando o risco inflacionário.

“Esse miolo da curva em 12,70% não é razoável. Não duvido que a Selic tenha de subir para esse patamar para entregar a inflação em 3%, mas não vejo o Banco Central cravando essa meta. A inflação deve ficar um pouco acima disso, mas também não pode passar de 4%”, comenta Cappa, destacando que o BC pode ter alguma margem de flexibilidade.

Dados de comércio e percepção econômica

Internamente, a Pesquisa Mensal de Comércio (PMC) de agosto, divulgada no mesmo dia, também gerou impacto nas expectativas econômicas. As vendas no varejo caíram 0,8% no varejo ampliado, contrariando as expectativas de alta de 0,2%, e recuaram 0,3% no varejo restrito, uma queda menor do que o esperado. Mesmo com esses resultados negativos, os economistas da Kínitro Capital alertam que a atividade econômica segue aquecida no Brasil, impulsionada pelo mercado de trabalho forte e o crescimento do crédito.

Leia também: Inflação acelera, mas bares e restaurantes mantêm preços estáveis em 2024

A análise interanual mostra que o varejo restrito subiu 5,1% em agosto de 2024 em comparação ao mesmo período de 2023, enquanto o varejo ampliado registrou alta de 3,1%. Esses números, segundo especialistas, corroboram a visão de que o Produto Interno Bruto (PIB) do terceiro trimestre continua em trajetória de crescimento, embora em ritmo moderado.

A combinação de incertezas fiscais e influências externas tem mantido a volatilidade no mercado de juros. As expectativas para o comportamento da Selic nos próximos meses continuam a ser ajustadas, enquanto o governo busca uma solução para equilibrar as contas públicas sem comprometer o crescimento econômico. O mercado, por sua vez, seguirá atento aos próximos desdobramentos tanto na política monetária doméstica quanto nas decisões do Federal Reserve nos Estados Unidos.

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